Vícios - Tão raiz por ser fuga, dor e paz


O vício, a fuga de um estado que agride para outro que conforta. É no fugir de tudo, dos pensamentos, das memórias das feridas que parecem não se curar, que parecem fuzilar às cegas a tua consciência, que te faz agir cegamente na busca de coisas para preencher esse vazio causado pela angústia - bem familiar, das coisas que você não entende, dos motivos que você não compreende, do que você já não pode mais ter controle e da dor que te dilacera.

Agindo inconsciente, assassinando o tempo, aniquilando a existência, se perdendo na realidade, na fugacidade dos medos, das assombrações e do passado.
Passado é uma caixinha que as vezes não se contêm em seu espaço, que às vezes sai sorrateiramente como uma onda de sussurros te invadindo, te mobilizando, te atacando, te devorando.

Dos pesadelos metafóricos, do simbolismo oculto da mente como escape e de noites mal dormidas como um preço a pagar por tudo aquilo que você viveu e que você não teve a chance de ser culpado ou ter consciência da culpa.
E o quarto que aprisiona, da graça ao assoalho da solidão de quem se perde. Fazendo prisioneiro, mesmo tendo as chaves no bolso.

Até certa medida a fuga pode ser saudável – a fuga em crenças, livros, amores, solidão, cartão de crédito, filmes, academia e drogas, mas quando passa da medida é erro e caminho sem volta. Quando o corpo perde o controle, quando o organismo depende, vira um revés. 

Mas o pior de tudo é perceber.
Perceber a raiz que te difere do céu, de perceber esse derrame de água podre que se esvai dos olhos, a contingência se desfaz e eu sou só água. Sozinho, inquieto, no centro do quarto, com jeito de adeus.
O vicio é tão raiz por ser fuga, dor e paz, por ter essa forma de consolo, de negar, por ser escape e ruínas. É uma porta que a gente abre como saída de emergência, mas nos impede de andar.

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