Sinto falta - Saudades de outrora (Epílogos de infância)
Já senti
saudades.
Ao longo do
tempo eu vi a escassez de alguns valores. Da penúria dos encontros e
desencontros, dos epílogos, desfechos, coroações e nascimentos.
Sinto saudades
de um espaço perdido no tempo, da magia do desconhecido, do aprendizado do
conhecido.
Do viver a
noite na ternura de uma roda de amigos a brincar. Sinto saudades dos choros
calados.
Os sonhos de
outrora, o esquecimento levou pra longe. Eu não sei mais. Sonhos, aspirações de
que eu não pude sonhar, sonhos que eu não consegui alcança-los, quimeras da
minha infância.
Sinto falta
do tempo em que não via maldade estampado nas pessoas, pois a única maldade era
a negação. Do tempo em que eu achava que tudo era eterno, que tudo era para
sempre, até conhecer as mortes e funerais.
Sinto
saudades daquelas pessoas que fizeram parte da minha vida e que hoje não tenho
mais noticias, dos que brincaram comigo e hoje eu nem entrevejo, vi num vislumbre
encantador a se tornar aquela essência perdida, esquecida nos desencontros.
Sinto falta
dos sonhos que esqueci, dos aniversários, da música que não ouvi, dos balões
coloridos, dos amores que perdi.
Sinto falta
dos desejos que ocultei, sinto falta das imaginações interrompidas, dos dias
que não dancei, do tempo em que eu não cantei.
Saudades da
liberdade a florar em um campo em que eu podia sonhar.
Da aquarela
borrada, das cores que não foram pintadas, das ilusões que eu não pude comprar.
Da inocência
que foi roubada, da pureza deteriorada. Tais coisas que carregam na mala da
infância, hoje apenas coisas que se perderam com o vento e levadas pra longe.
Saudades de
acordar cedo e correr pra ver o sol nascer, de quando anoitecer ver a lua a
brilhar e puder sonhar de um dia chegar lá.
Das noites
de mais sã calmaria.
Sinto falta
que as únicas preocupações eram o programa infantil da TV que não conseguia
assistir, dos doces que não ganhei e dos que não pude comer, de correr atrás de
confeitos, dos brigadeiros roubados em aniversários, das velas e dos “com quem
será”.
Sinto
saudades das aulas perdidas, dos colegas com quem eu não brinquei. Da desculpa
da dor de barriga pra não ir à escola. Dos desenhos que foram rasgados, das
pinturas bonitas e perdidas de um retrato.
Sinto falta
das brincadeiras que não foram executadas, de correr atrás de pipas, de correr atrás
das folhas de outono que caia e do desejo de guarda-las para o futuro. Do verão
na praia e dos castelos construídos com areia e derrubados e levados pelo mar. Do
inverno com medo das trovoadas a correr pra cama de seus pais. De que o único pesadelo
era sonhar com monstros. Hoje descobri
que monstros somos nós por destruímos os sonhos.
Sonhei em ser grande, hoje eu sonho em ser
pequeno. Hoje o tudo de metáforas, toda essa magia cada vez mais extinta pelas
pessoas afora.
Chega um tempo em que o hoje se torna
motivo de saudades.
‘Não me leve
agora. Eu não quero ir embora, tenho tanto pra fazer e motivos pra crer que
ainda não é hora. ’
- Epílogos e finais
Sinto falta da
vida que não vivi, sinto falta do céu estrelado daquela noite serena, da dor de
um joelho ralado, do beijinho de boa noite que não foi dado. Sinto falta dos
brinquedos quebrados, dos amigos deixados, dos entes que não voltaram. Mas,
também sinto falta do tempo desperdiçado, dos tempos e vidas perdidas, do
tempo que eu perdi. E desse eu sei que só me resta sentir saudade.
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